ACT WITHOUT WORDS (1956)[1]
Pantomima para um ator[2].
Samuel Beckett
Tradução Marcus Mota
(Janeiro 2008)
Deserto. Luz ofuscante[3].
Um homem é lançado para o palco, vindo da direita ao fundo[4]. Ele cai, levanta-se de imediato, tira o pó de si, coloca-se em paralelo e põe-se a pensar[5].
Assovio partir do canto direito da cena[6].
Ele se põe a pensar e depois vai saindo de onde havia entrado.
De imediato ele é lançado de volta para o palco, levanta-se de imediato, tira o pó de si, coloca-se em paralelo e põe-se a pensar.
Assovio a partir do canto direito da cena.
Ele põe-se a pensar, vai em direção do canto esquerdo da cena,hesita, avalia mais,pára, coloca-se em paralelo e põe-se a pensar.
Uma árvore pequena desce de cima, suspensa, para a superfície do palco[7]. A árvore possui um galho simples que fica a quase três metros de altura do chão[8] e na parte de cima uma moita de poucos galhos e folhas, que projeta para sua base um círculo de sombra.
O homem continua a pensar.
Um assobio vindo de cima.
Ele se vira, vê a árvore, anda na direção dela, senta-se sobre a sua sombra, olha para as suas mãos.
Uma tesoura de alfaiate desce de cima, suspensa, vindo a ficar na frente da árvore, a quase um metro do chão.
Ele continua a olhar para suas mãos.
Um assobio vindo de cima.
Ele busca com os olhos, vê a tesoura, pega o objeto, e começa a aparar suas unhas.
Os galhos se fecham como uma sombrinha, a sombra desaparece.
Um pequeno jarro d’água, no qual está afixado um grande rótulo com os dizeres “Água”, desce de cima, suspenso, até ficar a quase três metros do chão, onde permanece em atrativo balanço.
Ele continua a pensar.
Um assobio vindo de cima.
Ele busca com os olhos, vê o pequeno jarro d’água,ergue-se,anda e pára debaixo dele, tenta em vão pegar o objeto, desiste, coloca-se em paralelo e põe- se a pensar.
Um cubo grande desce de cima, suspenso, para a superfície do palco.
Ele continua a pensar.
Um assobio vindo de cima.
O homem se vira, vê o cubo, olha para ele, para o pequeno jarro d’água, pensa, anda em direção ao cubo,ergue-o, carrega-o, coloca-o sob o jarro d’água, testa a estabilidade do cubo, sobe nele, tenta em vão pegar o jarro, desiste, desce do cubo, carrega o cubo de volta de onde o havia retirado, coloca-se em paralelo e põe-se a pensar.
Um segundo cubo, menor, desce de cima, suspenso, para a superfície do palco.
Ele continua a pensar.
Um assobio vindo de cima.
Ele se vira, vê o segundo cubo,olha para ele,para o jarro,anda em direção ao segundo cubo, ergue-o, carrega-o, coloca-o sob o jarro, testa a estabilidade do cubo,sobe nele, tenta em vão pegar o jarro,desiste, desce do cubo, carrega o segundo cubo de volta, hesita,avalia melhor,coloca no chão o cubo, anda na direção do cubo grande,ergue-o,carrega-o, coloca-o sobre o menor, testa a estabilidade,sobe neles, o arranjo dos cubos desmorona, o homem cai, levanta-se de imediato, afasta-se e põe-se a pensar.
Ele ergue o cubo pequeno,coloca-o sobre o maior, testa a estabilidade, sobe neles e quando está prestes a alcançar o jarro, o jarro é puxado para cima um pouco,ficando assim além de seu alcance.
Ele desce, põe-se a pensar, carrega os cubos para o lugar onde estavam, um de cada vez, fica em paralelo e põe-se a pensar.
Um terceiro e ainda menor cubo desce de cima, suspenso, em direção à superfície do palco.
Ele continua a pensar.
Um assobio de cima.
Ele se vira, vê o terceiro cubo,olha para ele, põe-se a pensar, fica em paralelo, põe-se a pensar.
O terceiro cubo é puxado pra cima e desaparece.
Junto do jarro, desce uma corda, suspensa, com nós para auxiliar a escalada.
Ele continua a pensar.
Assobio de cima.
Ele se vira,vê a corda,põe-se a pensar,anda na direção dela, sobe na corda e quando está prestes a alcançar o jarro, a corda é solta, e ele cai de costas no chão.
Ele põe-se a pensar,procura em volta pela tesoura, encontra a tesoura, anda em direção dela, recolhe-a, vai para a corda e começa a cortar a corda com a tesoura.
A corda é puxada para cima,erguendo o homem,ele dependurado na corda, cortando-a,até romper a corda, e cair de costas no chão,largar a tesoura, levantar-se de imediato, afasta-se e põe-se a pensar.
A corda é puxada pra cima bem rápido e desaparece.
Do pedaço de corda que sobrou o homem faz um laço e tenta laçar o jarro.
O jarro é puxado para cima e desaparece.
O homem fica em paralelo e põe-se a pensar.
Ele vai com o laço em sua mão para a árvore, olha para o galho,vira-se e olha para os cubos, olha novamente para o galho,larga o laço, anda em direção aos cubos,ergue o menor, carrega o cubo e o deixa sob o galho, anda de volta na direção do cubo maior,ergue-o e o carrega, deixando-o sob o galho,tenta colocar o cubo grande sobre o maior, hesita, avalia melhor, coloca o maior embaixo, o menor em cima, testa a estabilidade disso, coloca-se em paralelo e pára para pegar o laço do chão. O galho envolve-se no tronco. O homem endireita-se, o galho em suas mãos, vira-se e vê o que aconteceu.
Ele deixa cair o laço, coloca-se em paralelo e põe-se a pensar.
Ele carrega de volta os cubos para o lugar onde estavam, um de cada vez, anda em direção ao laço, coloca-o sobre os cubos, enrodilhando-o em cima do cubo menor.
Ele se coloca em paralelo e põe-se a pensar.
Assovio vindo da direita ao fundo.
Ele pensa, e vai pra sua saída à direita.
De imediato ele é arremessado para o palco, então levanta-se de imediato, afasta-se, coloca-se em paralelo, e põe-se a pensar.
Assobio vindo da esquerda ao fundo.
Ele não se move nada.
Ele olha para suas mãos, procura com os olhos a tesoura, vê a tesoura, anda e pega a tesoura, começa a aparar suas unhas,pára, põe-se a pensa, passa o dedo na lâmina da tesoura, anda e deixa a tesoura sobre o cubo pequeno, coloca-se em paralelo, abre a gola de sua camisa, movimenta seu pescoço com liberdade, e toca nele com um dedo seu.
O cubo pequeno é puxado para cima e desaparece, levando com ele o laço e a tesoura. Ele se vira para pegar a tesoura e percebe o que aconteceu.
Ele fica em paralelo, e põe-se a pensar.
Ele vai e se senta sobre o cubo grande.
O cubo é puxado pra cima do homem. O homem cai. O cubo é puxado pra cima e desaparece.
O homem permanece onde está, seu rosto voltado para a audiência, frente a frente com ele.
O jarro desce de cima e repousa a quase um metro do corpo do homem[9].
O homem não se move nada.
Assovio vindo de cima.
Em seguida o jarro desce, balança-se atrativamente brincando bem em frente do rosto do homem.
O homem não se move nada.
O jarro é puxado pra cima e desaparece.
O galho fica na horizontal novamente, os ramos se abrem, a sombra retorna.
Assovio vindo de cima.
O homem não se move nada.
A árvore é puxada pra cima e desaparece.
Ele olha para suas mãos.
Pano.